Porquê a autopoiese? Maturana contou-me um dia como é que esta expressão lhe veio à cabeça. Inicialmente, tinha trabalhado com estruturas circulares, com o conceito de reprodução circular da célula. A palavra “circular” é uma palavra comum que não cria mais problemas terminológicos, mas para Maturana faltava-lhe precisão. Depois, um filósofo, por ocasião de um jantar ou de qualquer outro acontecimento social, deu-lhe uma pequena conferência privada sobre Aristóteles. O filósofo explicou-lhe a diferença entre praxis e poiesis. A praxis é uma ação que inclui a sua finalidade em si mesma como ação. Aristóteles referia-se aqui ao ethos da vida na polis, à sua virtude e excelência, chamada arrte, cuja importância não se deve à sua contribuição para a criação de uma boa cidade, mas que já faz sentido por si só. Outros exemplos seriam nadar – não se faz para chegar a algum lado – ou fumar, conversar, ou as reflexões nas universidades, que também são ações que satisfazem como tal sem conduzirem a quaisquer resultados. O próprio conceito de praxis já inclui a auto-referência. A poiesis foi explicada a Maturana como algo que produz algo externo a si próprio, nomeadamente um produto. A poiesis também implica ação; no entanto, age-se não porque a ação em si é divertida ou virtuosa, mas porque se quer produzir algo. Maturana encontrou então a ponte entre os dois conceitos e falou de autopoiese, de uma poiesis como seu produto – e enfatizou intencionalmente a noção de um produto. Autopraxis, por outro lado, seria uma expressão sem sentido, porque apenas repetiria o que já se entende por praxis. Não, o que se pretende aqui é um sistema que é o seu próprio produto. A operação é a condição para a produção de operações. (Einführung in die Systemtheorie. Heidelberg: Carl-Auer-Systeme, 2002a, 110-11)