MAO1996
Para cumprir sua função como instrumento, a linguagem precisa ser formalizada, o que ocorre por meio da criação de linguagens artificiais que são cálculos lógicos. Heidegger, de nenhum modo, condena a pesquisa contemporânea sobre a linguagem, especificamente a construção de “metalinguagens”. Essa pesquisa tem seu direito específico e conserva seu peso próprio. Ela fornece, sempre, a seu modo, algo útil para aprender [^M. Heidegger, Das Wesen der Sprache, op. cit., p. 161.]. O que importa para Heidegger é que ela é apenas um dos possíveis modos de revelação da linguagem. Ela é a linguagem que se revela enquanto vinculada à subjetividade [^M. Heidegger, Die Sprache, op. cit., p. 14.], à experiência do real a partir da subjetividade que comunica e se comunica; em suma, é portanto a revelação da linguagem como obra da subjetividade[^A linguagem, enquanto informação, não é a linguagem enquanto tal mas é a expressão suprema daquilo que constitui sua manifestação específica nos tempos modernos. M. Heidegger, “Der Weg zur Sprache”, in: Unterwegs, op. cit., pp. 264ss.; “Das Ende der Philosophie und die Aufgabe des Denkens”, in: Zur Sache des Denkens, Tübingen, 2” ed., 1976, pp. 61ss.]. Ora, a grande questão que o homem contemporâneo pode levantar é: o caráter instrumental da linguagem diz-nos tudo sobre a linguagem? Será que o processo contemporâneo, tecnocientífico, de racionalização da linguagem esgota todas as experiências humanas com a linguagem?[^R. Capurro, op. cit., pp. 338ss.]
A experiência da linguagem como informação se faz a partir de determinado paradigma: o paradigma da subjetividade, da consciência, que encontrou sua realização plena na atual fase de nossa civilização. Não é possível experimentar a linguagem desde outro paradigma, para além da relação sujeito-objeto, consciência-mundo? Em suma, para Heidegger, a manifestação epocal da linguagem como informação pressupõe o paradigma das teorias da consciência e da representação. Todo o seu esforço filosófico consiste em mostrar as bases de outro paradigma de pensamento, a partir de onde é não só possível um outro tipo de experiência com a linguagem, mas onde a linguagem constitui momento fundamental para toda experiência do real. Ora, o que Heidegger pretende, não negando o valor do caráter instrumental da linguagem, é fazer o “passo para trás”, a fim de poder pensar a relação originária do homem com a linguagem [^Essa relação originária do homem para com a linguagem é sempre pressuposta na ciência e na filosofia, porém nunca é propriamente tema de consideração. Trata-se de perguntar de que modo, por meio da linguagem, o “Ser” se desvela a nós e se nos dá: W. Anz, “Die Stellung der Sprache bei Heidegger”, in: Heidegger, ed. por O. Pöggeler, Perspektiven zur Deutung seines Werkes, Köln-Berlim, 1969, pp. 306ss.] que, para ele, não constitui uma pesquisa a mais ao lado das ciências e da filosofia da tradição, mas é uma descida a seus “fundamentos”, pois é essa relação originária que é sempre pressuposta em toda ciência e filosofia [^Para Heidegger, trata-se, acima de tudo, de fazer uma experiência com a linguagem, o que é fundamentalmente diferente de ter conhecimentos sobre a linguagem: M. Heidegger, Das Wesen der Sprache, op. cit., p. 160. Para o sentido de “experiência”, ver p. 169. Heidegger articula sua tentativa com a frase: trazer a linguagem enquanto linguagem à linguagem: M. Heidegger, “Der Weg zur Sprachen”, in: Unter wegs, op. cit., p. 242.].