Pickles1985
Este espaço quotidiano da preocupação do homem em lidar com as coisas normalmente não é tematizado. Primordialmente, essa espacialidade deriva do envolvimento com o mundo e cria lugares e relações entre hierarquias de lugares. Mas, pelo facto de esta espacialidade ser tão descoberta, pode também tornar-se um tema para a ciência. Ao renunciar ao envolvimento nesses lugares, o espaço pode ser estudado apenas através do olhar. Através da projeção de um mundo de entidades meramente existentes e da sua subsequente formalização em termos das suas relações entre si, o espaço puro das ciências pode ser derivado e as relações espaciais descobertas. Através de uma série de etapas de formalização, podem ser projetados espaços abstratos de diferentes tipos e graus de generalidade. O que vimos anteriormente como “regiões ambientais” é aqui neutralizado para dimensões puras. Os lugares e as suas correspondentes constelações de envolvimentos são reduzidos a uma multiplicidade de posições. A espacialidade do equipamento pronto a usar dentro do mundo é destituída do seu carácter de envolvimento e torna-se meramente presente à mão. Os lugares são uma questão de indiferença, tornando-se meras localizações — pontos espácio-temporais que não se distinguem uns dos outros (Heidegger, 1927, 361-2).11
O mundo perde o seu carácter de mundo-ao-redor (Umwelt); o ambiente torna-se o mundo da Natureza. O “mundo”, como uma totalidade de equipamento pronto a ser utilizado, torna-se espacializado num contexto de Coisas alargadas que estão apenas presentes e nada mais. O espaço homogéneo da Natureza só se mostra quando as entidades que encontramos são descobertas de tal forma que o carácter mundano do pronto-a-usar fica especificamente privado da sua mundanidade.
Tais espaços paramétricos só se tornam acessíveis se o ambiente for privado do seu caráter mundano. Mas já estabelecemos que a espacialidade do homem só pode ser encontrada com base no mundo.
Para a mente calculista, o espaço e o tempo aparecem como parâmetros para a medição da proximidade e do afastamento, e estes, por sua vez, como distâncias estáticas. Mas o espaço e o tempo não servem apenas como parâmetros; neste papel, a sua natureza depressa se esgotaria — um papel cujas formas seminais são discerníveis desde cedo no pensamento ocidental, e que depois, no decurso da era moderna, se tornam estabelecidas por esta forma de pensar como a concepção padrão. (Heidegger, 1971c, 102)