[HEIDEGGER, Martin. Contribuições à Filosofia (Do Acontecimento Apropriador). Tr. Marco Antonio Casanova. Rio de Janeiro: Via Verita, 2014, §76]

20) As “universidades”, enquanto “sítios da investigação e da doutrina da ciência” (assumindo tal modo de ser, elas são construtos do século 19) se transformam em puras instituições funcionais cada vez mais “próximas da realidade efetiva”, nas quais nada chega a se decidir. Elas só se mantêm como o último resto de uma decoração cultural, enquanto elas precisam permanecer em um primeiro momento ainda ao mesmo tempo um meio para a propaganda “político-cultural”. Uma essência qualquer de “universitas” não tem mais como ser desdobrada a partir delas: por um lado, porque a utilização político-populista torna supérfluo algo desse gênero, e, em seguida, porém, porque o funcionamento da ciência pode ser mantido em movimento de maneira muito mais segura e confortável mesmo sem o “elemento universitário”, o que significa aqui simplesmente, sem a vontade de meditação. A filosofia, compreendida aqui apenas como meditação pensante sobre a verdade, isto é, sobre a questionabilidade do seer, não como erudição historiológica capaz de fabricar “sistemas”, não tem na “universidade” e na instituição funcional na qual ela se transformará simplesmente nenhum lugar. Pois ela não “tem” em geral em parte alguma tal lugar para além daquele que ela mesma funda, para o qual, porém, não consegue conduzir imediatamente nenhum caminho marcado por uma instituição fixa.

21) A caracterização mencionada da “ciência” não emerge de uma hostilidade em relação à ciência, porque tal hostilidade não é em geral possível. Apesar de toda a sua extensão, de toda a segurança do sucesso e de toda comodidade, a “ciência” não tem em si de modo algum as pressuposições de um nível hierárquico essencial, com base no qual ela poderia ser voltada algum dia para o interior de uma oposição em relação ao saber do pensamento. A filosofia não é nem contra, nem a favor da ciência, mas a entrega à sua própria busca pela sua própria utilidade, para assegurar resultados cada vez mais utilizáveis de maneira cada vez mais rápida e mais manuseável e, assim, para amarrar a utilização e a necessidade de modo cada vez mais indissolúvel na dependência dos respectivos resultados e de sua ultrapassagem.

Martin Heidegger