Nietzsche (Bem Mal) – O cientista é um plebeu do espírito

Comparado ao gênio que é feito para procriar e parir, as duas palavras tomadas em toda a força dos termos, o cientista, o homem de ciência médio conserva hoje um pouco da solteirona: pois ignora, como ela, as duas funções mais preciosas do ser humano. Para uns e para outros, para cientistas, como para as solteironas, concede-se como compensação uma espécie de consideração; insiste-se nesta consideração que lhes é devida e esta concessão obrigatória é acompanhada, nos dois casos, por uma mesma dose de mau humor. Olhemos mais de perto para isto que é um homem de ciência?

É, antes de mais nada, uma variedade plebeia da humanidade, com as qualidades de uma raça plebeia, nem autoritária, nem dominadora, nem segura de sua própria opinião; ele tem assiduidade ao trabalho, docilidade para ficar na fila, regularidade e mediocridade nas aptidões e necessidades; conhece instintivamente seus semelhantes pelo faro e sabe do que eles necessitam — por exemplo, daquele pouco de independência e de verde sem os quais não se pode trabalhar tranquilo a necessidade de ver seus méritos reconhecidos (o quê supõe primeiro e acima de tudo que se seja reconhecível e reconhecido), o raio de sol de uma boa fama, o desejo de ver-se confirmar a propósito de tudo, através de um selo, seu valor e sua utilidade, o que ajuda a vencer a desconfiança de si que carregam no coração todos os homens subalternos e os animais que vivem em bandos.

F. Nietzsche, Além do bem e do mal (U.G.E. 10/18,1965, pp. 137-139)