Ao se dedicar ao estudo da ontogenia, que os levou a formular o princípio que denominaram de autopoiese, os biólogos chilenos Francisco Varela e Humberto Maturana1 enunciaram várias constatações de interesse:
- primeiro, que cada ser começa com uma estrutura inicial, que condiciona o curso de suas interações, e restringe as mudanças estruturais que as interações podem disparar nesta estrutura inicial;
- ao mesmo tempo, este mesmo ser nasce também em um lugar particular, em um meio, que constitui a ambiência onde emerge e interage;
- este meio parece ter uma dinâmica estrutural própria, operacionalmente distinta do referido ser vivo;
- como observadores distinguimos o ser vivo como uma unidade, destacada de seu meio, e o caracterizamos como uma organização definida;
- distingue-se, portanto, duas estruturas que irão ser consideradas operacionalmente independentes entre si: ser vivo e meio;
- existe entre elas uma necessária congruência estrutural (ou a unidade do ser desaparece);
- a interação entre elas não é do tipo instrutiva, ou educativa, como propõe Piaget, pois não determina seus efeitos; melhor dizendo, ela dispara efeitos.
Maturana & Varela aprofundaram ainda mais suas constatações no campo da Biologia, revelando novos aspectos da relação ser-meio, bastante significativos para as pesquisas associadas às emergentes Ciências Cognitivas, e, porque não, para outras ciências, como por exemplo a Geografia:
- primeiro fato importante, nas interações entre ser e meio, dentro desta congruência estrutural, as perturbações do meio não determinam o que acontece com o ser, ou melhor, é a estrutura do ser que determina que mudanças ocorrem nele;
- mudanças que resultam da interação entre o ser e seu meio são trazidas por um agente perturbador, mas determinadas pela estrutura do sistema perturbado; o caminho inverso vale também para o meio;
- enquanto não se entrar em uma interação destrutiva, se observará entre ser-meio uma compatibilidade, onde ambos atuam como fontes mútuas de perturbação, disparando mudanças de estado – processo denominado acoplamento estrutural, em que se observa os princípios de conservação da autopoiese e da adaptação;
- organização denota dentro desta perspectiva, aquelas relações que devem existir entre os componentes de um sistema, para que ele seja um membro de uma classe específica; a estrutura denota, por sua vez, os componentes e as relações que na realidade constituem uma unidade particular, e tornam sua organização real.
- a chave para a compreensão desta dialética complexa é que só podemos tratar de unidades estruturalmente determinadas.
MATURANA, Humberto & VARELA, Francisco J.. The Tree of Knowledge – The Biological Roots of Human Understanding. San Francisco: Shamballa, 1992. ↩