Heidegger (GA45) – historiológico

HEIDEGGER, Martin. As Questões Fundamentais da Filosofia (“Problemas” seletos da “lógica”). Tr. Marco Antonio Casanova. São Paulo: Martins Fontes, 2017

A inserção na história talvez não se mostre sempre e necessariamente como tal fuga diante das tarefas “atuais”. Pode-se considerar o passado a partir dos pontos de vista e segundo os critérios do presente vivo. Por meio disso, o passado é liberado de seu encrostamento, é relacionado com o presente e se torna tempestivo. Só tal consideração do passado se torna efetivamente uma sondagem do passado; pois é isso também que significa a palavra “historiológico”: istorein – explorações. Por isso, “historiologia” e “historiológico” significam para nós: sondagem do passado a partir do campo de visão do presente. Nesse caso, esse campo de visão pode se mostrar como algo óbvio. Por exemplo, quando Ranke – em oposição consciente às supostas construções históricas de Hegel – acredita estar apresentando o passado tal como ele foi, determinados critérios normativos da interpretação também se mostram para ele como diretrizes – só que esses critérios são diferentes dos hegelianos. Ou, por outro lado, os critérios de medida retirados do presente são estabelecidos expressamente como tais, e o passado se torna expressamente tempestivo. Os dois tipos de consideração historiológica não se distinguem de maneira fundamental.

Ora, mas ainda resta aqui naturalmente uma pergunta: se os critérios de medida e as normas diretivas da consideração historiológica são hauridas do respectivo presente – seja expressa ou inexpressamente –, será que já está com isso decidido que esses critérios são suficientes para apreender o passado? Pelo fato de um presente ser o presente e o hoje respectivo, ainda não se garantiu que os critérios atuais correspondem e estão à altura do que há de respectivamente grande em um passado. Em verdade, todo passado pode ser em qualquer tempo apresentado de maneira tempestiva. Nisso reside o elemento funesto de toda consideração historiológica. Seria bem possível, porém, que um presente seja tão calcificado quanto o passado, e que os critérios de medida de um presente não passem de péssimas estacas de um passado não mais concebido. Seria bem possível que um presente estivesse totalmente preso em si e, por isso, justamente cerrado e lacrado contra aquilo que o passado tem a dizer. A mera relação daquilo que passou com o respectivamente presente chega, em verdade, necessariamente e, em certa medida, de modo bastante confortável, a resultados sempre novos, já que, a cada vez, um presente sempre pode ser diverso ante o presente anterior. Mas esses novos resultados historiológicos, com os quais as pessoas se embriagam e com recurso aos quais elas se arrogam superiores ante a ciência historiológica mais antiga, também já se tornam caducos antes mesmo de terem se tornado propriamente novos, porque o presente logo se torna um outro e o caráter tempestivo continua sendo o que há de mais inconstante. Por isso, toda consideração historiológica é sedutora.