Heidegger (GA5:124-125) – Verdade como certeza

[HEIDEGGER, Martin. Caminhos de Floresta. Tr. Irene Borges-Duarte et alii. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2014, p. 161-162]

Desde que a Filosofia Moderna pisou aquilo que, para ela, é terra firme, vigora a verdade como certeza. O verdadeiro é o sabido no saber-de-si-mesmo incondicionado. Antes, entendia-se a verdade como sendo a concordância do representar com o ente. A verdade é uma característica do representar. Mas, como certeza, a verdade é agora o próprio representar, na medida em que o atribui a si mesma e se certifica de si mesma como representificação. O estar-sabido que se certificou do seu saber e, justamente, ante si mesmo e em si mesmo, já se retirou, assim, de todo o representar isolado de objectos. Já não se fixa nos objectos para obter o verdadeiro neste fixar-se neles. O saber desprende-se da relação [Relation] para com os objectos. O representar, que se sabe como um atribuir, desprende-se (absolvere) de [tentar] encontrar no representar unilateral do objecto a sua suficiente segurança. O desprendimento permite que este representar subsista, mas, com efeito, de um modo em que já não se atenha apenas ao seu objecto. Este desprender-se da relação objectual [gegenständlich] por parte da certeza de si é a sua absolvência [Absolvenz]. E próprio dela ter a ver com toda a relação que visa apenas directa-mente o objecto. A absolvência [Absolvenz] só é aquilo que é na medida em que se consuma em todos os sentidos, quer dizer, na medida em que se absolve plenamente. E no absolver-se da sua absolvência que a certeza de si do representar alcança a segurança e isto, para ela, significa alcançar o campo livre da sua essência. Declara-se livre de todo o vínculo unilateral aos objectos e do mero representar destes. A certeza incondicionada de si é assim a absolvição [Absolution] dela mesma. A unidade de absolvência (desprendimento da relação), absolver-se (completude do desprender-se) e absolvição (ilibação libertadora da completude) caracterizam a absolutidade do absoluto. Todos estes momentos da absolutidade têm o carácter da representificação [Repräsentation]. Neles se essência a parusia do absoluto. Só o verdadeiro, no sentido da certeza incondicionada de si, é o absoluto. Só a caracterizada absolutidade do representar-se é o verdadeiro.