Feyerabend – O conhecimento está ao fim de caminhos múltiplos

Se quisermos entender a natureza, se quisermos dominar nosso ambiente físico, devemos servir-nos de todas as ideias, de todos os métodos e não só de uma seleção de alguns dentre eles. Afirmar, ao contrário, que não existe conhecimento fora da ciência (extra scientiam nulla salus) não passa de um comodíssimo conto de fadas. As tribos primitivas têm assim classificações de animais e de plantas mais detalhadas que a zoologia e a botânica científicas contemporâneas; conhecem remédios cuja eficácia surpreende os médicos […]; têm, para influenciar seus próximos, meios que a ciência durante muito tempo considerou inexistentes (Vodu); resolvem problemas difíceis trazendo-lhes soluções que ainda não foram totalmente compreendidas por nós (construção das pirâmides, viagens polinésias). Do mesmo modo, existia uma astronomia altamente desenvolvida e internacionalmente conhecida na velha idade da pedra; esta astronomia era factualmente adequada e ao mesmo tempo emocionalmente satisfatória, pois resolvia ao mesmo tempo problemas físicos e problemas sociais (não se pode dizer o mesmo da astronomia moderna), e era verificada por meios muito simples e engenhosos (observatórios de pedra na Inglaterra e no sul do Pacífico; escolas astronômicas na Polinésia). […] Em todos os tempos, o homem abordou seu ambiente com os sentidos totalmente abertos e inteligência fértil; desde sempre ele fez incríveis descobertas; em todas as épocas, suas ideias permitem-nos aprender.