Beaune – Filosofia dos meios técnicos – matéria, instrumento, autômato

Este grosso volume, Philosophie des milieux techniques, de Jean-Claude Beaune, publicado em 1998, trata primordialmente das técnica e da tecnologia, das máquinas, de objetos concebidos e fabricados, de artifícios e de autômatos. Tantas óticas que se recobrem em parte mas deixando, através desta pluralidade reivindicada, entrever um ponto comum: um objeto técnico não tem sentido por si mesmo mas pelo fato que ao seu redor se estabelece um meio de trabalho, de valores, de imagens e de razões. Cada objeto é assim portador desta qualidade expressiva cuja síntese designa “a tecnicidade”, sob suas formas múltiplas: desde o compagnonnage aos sistemas informáticos passando pela manufatura, a usina – sem esquecer o museu e a escola pois a arte e a informação concernem igualmente esta organização – são meios que tecem o quadro histórico, social, político e simbólico de nossa existência.

A filosofia associada à história, à ciência, aos mecanismos de concepção, de classificação, de constituição do mundo sensível, nos propõe algumas chances de experimentar, através destes meios, algumas de suas próprias questões fundamentais que são também aquelas que a técnica é levada a se dar conta: o ser e a existência; o um e o múltiplo; o mesmo e o outro; o espírito e o corpo; o natural e o cultural; o normal e o patológico; a vida e a morte. As perspectivas são consideradas no espíritos dos grandes “tecnólogos” cruzados com as orientações de certa epistemologia que, desde Comte passando por Bachelard, Canguilhem, Foucault, Dagognet, deve permitir estender uma “rede” de conceitos e de imagens capaz de apreender o que constitui talvez “o meio dos meios”, a última interrogação: a técnica em seus meios, heideggeriana ou não, remete à questão última e pré-socrática da matéria e de nossas impotências a exprimi-la verdadeiramente senão segundo uma arte, uma poética de dimensão quase sobre-humana.

Sumário

  • O ofício e o meio originário

    • A técnica de base

    • A magia problemática

    • As técnicas na Antiguidade

    • O artesanato medieval: um mundo certe dele?

    • Os primeiros engenheiros (o Renascimento italiano)

    • O mito e a utopia: o artesão e o engenheiro

  • A tecnologia racionalista

    • A terceira substância: ótica e materialidade

    • Uma terceira via ou a lanterna mágica

    • O mito da razão enciclopédica

    • A manufatura e a guilhotina, mesmo combate

  • As ambiguidades da razão industrial

    • As condições da razão industrial

    • A gênese da industrialização

    • Capitalismo e antropologia

    • A cinemática em questões

    • Que sobra do trabalho?

    • Pesquisa, educação e desenvolvimento

    • A morte da mina

    • O vazio da fábrica

    • Uma crise de racionalidade?

    • O desaparecimento da máquina na sociedade tecnológica contemporânea

    • Perspectiva contrastada

  • Saber e invenção

    • Dificuldades da invenção

    • Formas filosóficas da invenção técnica: um problema sem solução?

    • O inconsciente técnico e o poder do corpo

    • Os dilemas da inovação

    • O tempo das técnicas

    • Invenção e criação

    • A impropriedade do dizer e do fazer

    • A patologia técnica

    • A invenção e o autômato: um exemplo

    • Mecanismo e maquinismo: anatomias moventes

    • Piscadela sobre a informática

  • O objeto técnico

    • O entorno do objeto

    • O objeto saturado

    • Tecnologia e memória

    • Informação do objeto técnico

    • A gênese dos objetos

    • A “mostração” do real

    • Formas de museu e arte da memória: objetos e imagens técnicas

    • O real pode ir ao paraíso?

    • O último dos mundos

  • A vida e a máquina

    • A medicina exclusiva e a tautologia

    • O objeto e o meio vivente

    • A morte e a máquina

    • Mestres e escravos do vivente

    • A lição de Semmelweis

    • A técnica e o remédio

    • Entre corpo e morte: o fantasma do indivíduo

    • As últimas lições de Descartes