Japiassu – A noção de precursor em «história das ciências»

A Revolução Científica Moderna

A rigor, se houvesse precursores, a história das ciências perderia todo o seu sentido. Porque a própria ciência só aparentemente teria dimensão histórica. Um precursor seria um pensador que teria percorrido antes um pedaço do caminho que outro iria terminar. Ora, antes de colocarmos juntos dois pesquisadores, numa sucessão lógica de começo e de acabamento, de antecipação e de realização, convém nos assegurarmos de que se trata do mesmo caminho. Por ter feito uma suposição heliocêntrica, Aristarco de Samos não é o precursor de Copérnico. Ora, Copérnico acusou todas as teorias astronômicas anteriores à sua de serem sistemas irracionais. Um precursor seria um pesquisador de vários tempos, desenraizado de seu enquadramento cultural e reinserido em outro. Em suma, enquanto não estabelecermos explicitamente, através de uma análise crítica dos textos, a existência, entre um pensador do passado e outro do presente, de uma identidade de questão, de intenção de pesquisa e de significação dos conceitos diretrizes, só arbitrariamente poderemos falar de precursor. Koyré tem razão quando diz: “A noção de precursor é muito perigosa para o historiador das ciências. E verdade, sem dúvida, que as ideias têm um desenvolvimento quase autônomo, isto é, nascidas num espírito, elas chegam à maturidade e dão fruto em outro: donde ser possível fazermos a história dos problemas e de suas soluções. Também é verdade que as gerações posteriores não estão interessadas nas que as precederam, senão na medida em que veem nelas seus ancestrais ou seus precursores. No entanto, é evidente — ou deveria sê-lo — que ninguém jamais se considerou precursor de outrem nem pôde fazê-lo. Por isso, considerá-lo como tal, é o melhor meio de se impedir de compreendê-lo” (La révolution astronomique, p. 79).