Zimmerman (Confronto Modernidade) – Movimentos modeladores das épocas

Ο entendimento de Heidegger, de que a moderna tecnologia é um meio de revelação das coisas, pode ser clarificado quando inserido no contexto da história da filosofia alemã. Do mesmo modo que Kant, Heidegger acreditava que a tarefa do filósofo era a de descobrir as condições transcendentais que tornaram viável o conhecimento e a acção humanos. Estas condições não são «coisas» em si próprias, mas antes tornam possível a nossa «experiência» objectiva das coisas. Na sua análise à tecnologia moderna tentou Heidegger descobrir as condições necessárias à possibilidade de uma nossa experiência unidimensional das entidades como matéria-prima. Tal como Hegel, Heidegger sustentava que as actividades humanas não são na sua maior parte auto-referenciais e autogeradoras, mas bem pelo contrário, guiadas e moldadas pela «interacção» histórica da linguagem e dos conceitos, que não está sob controlo humano. Esta interacção conceptual-linguística determina as categorias que moldam as possibilidades de conhecimento, de acção e de crenças humanas, em épocas históricas especificadas.

Embora seja certo que Heidegger rejeita o ensinamento de Hegel de que a história é um movimento progressivo em direcção à consciência divina de si próprio, os dois pensadores tentaram descobrir a natureza dos «movimentos» conceptuais e ontológicos que marcaram as diferentes épocas históricas em que a humanidade ocidental tem sido «lançada».

Heidegger acreditava que estes movimentos, que moldam as épocas históricas, não eram em si próprios visões do mundo, mas antes condições ontológicas necessárias ao emergir de uma específica visão do mundo. Para Heidegger, pois, a visão do mundo chamada de «modernidade» não era de modo algum um conceito definitivo para explicar a situação contemporânea, mas era antes o sintoma de um movimento mais profundo e tornado invisível.

Sustentava ele que o movimento destas épocas históricas principiou com a metafísica de Platão e culminou na era tecnológica. Os períodos maiores da história ocidental — grego, romano, medieval, iluminismo, tecnológico — marcam, na perspectiva de Heidegger, os estágios de um longo «declínio» em matéria de compreensão pela humanidade ocidental do que significa alguma coisa, «ser».

Na idade tecnológica, especialmente, «ser» significa para alguma coisa, o consistir em matéria-prima para o sistema tecnológico de auto-engrandecimento.

A interpretação de Heidegger sobre tecnologia moderna difere radicalmente da interpretação, muito mais familiar, da antropologia naturalista. De acordo com tal antropologia, a capacidade de consciência é um desenvolvimento evolucionário, que tornou o animal-homem especialmente adaptável a uma vasta variedade de climas e de condições materiais. A espécie humana sobreviveu por ter aprendido como fazer e usar utensílios e símbolos. Sob a perspectiva de tal antropologia, a moderna tecnologia industrial é apenas uma versão sofisticada dos utensílios da humanidade primeva. A grande diferença, entre a primitiva e a posterior tecnologia, é apenas a de que os utensílios mais recentes são concebidos e construídos em conformidade com os princípios científicos, desconhecidos em períodos anteriores da vida do homem.

Heidegger sustentou que esta visão naturalista e instrumentalista da tecnologia tem uma validade bastante limitada. Ele contestou as presunções sobre o «animal hábil» ao recusar-se a conceber o homem como mero animal dotado de mais elevada inteligência. Rebatendo o argumento de que a tecnologia industrial emergiu da experimentação histórica, por tentativa e erro com práticas materiais, ele sustentou, pelo. contrário, que a tecnologia industrial surgiu em resultado do modo unidimensional de compreender o que é «ser» uma coisa. Segundo Heidegger, para alguma coisa «ser» significa para ela «ser revelada» ou «ser manifesta».

Em qualquer dada época, o comportamento humano é moldado pela maneira como as coisas se manifestam a si próprias. Se as coisas se manifestam como criaturas de Deus, as pessoas tratam as coisas de certa maneira; se as coisas se manifestam como nada mais do que matéria-prima, as pessoas tratam-nas de outro modo.