Ernildo Stein (SZ §44) – Teoria do Conhecimento x Epistemologia

Pergunta: A questão das condições de possibilidade seria relativa às ciências do homem — então, as três perguntas de Kant remeteriam às ciências do homem. Pode-se pensar, contudo, que aquela pergunta “que posso conhecer” estaria remetida às ciências empíricas também. Então, Heidegger radicalizaria a questão transcendental até o ser-no-mundo, o Dasein, como condição de possibilidade de qualquer conhecimento, qualquer área?

Ernildo Stein: Não dá para fazer uma simples divisão, ciências humanas, ciências do espírito e ciências empírico-matemáticas. Claro, a partir de Kant te vem a ideia, uma vez que Kant teria desejado mostrar o que de fato já era reconhecido, isto é, o caráter científico do universo empírico-matemático. A leitura que Heidegger faz de Kant, entretanto, é fenomenológica e, neste sentido, desde o olheiro da analítica existencial, talvez, também, do ponto de vista da ontologia fundamental. Nesse sentido, ele elide a questão kantiana de fundamentação do conhecimento empírico-matemático e amplia o problema para uma questão do conhecimento. Uma questão, portanto, de teoria do conhecimento e não de epistemologia.

Penso que há que se distinguir: a epistemologia como conhecimento do produto, isto é, daquilo que fora de nós as ciências produzem, e gnoseologia — teoria do conhecimento — que é uma problematização das condições de possibilidade do conhecimento do ser humano. Heidegger, na discussão com Cassirer e depois mais profundamente em vários momentos, enfrentou essa questão, a de não tratar Kant simplesmente como epistemólogo, mas tentar redimir nele o metafísico. Não o metafísico no sentido clássico, de uma teoria do ser, mas no sentido de que Kant faz uma ontologia fundamental, isto é, analisa as condições de possibilidade daquele ente que conhece o ser. Heidegger, portanto, Heidegger lê a Crítica da Razão Pura sob uma óptica fenomenológica. O seu livro sobre Kant trata do conhecimento finito produzido via sensibilidade, os limites postos aí. Então, podemos dizer que, em Ser e tempo, Heidegger dá as condições de possibilidade de fundamentação das ciências humanas.