Alfred North Whitehead (1861-1947) passa, em geral, por ser o filósofo anglo-saxônico mais eminente de nosso tempo, e parece merecer de verdade esta consideração. Em todo caso, mostra ser um pensador original, dotado de assombrosa força espiritual. Sua carreira é inteiramente única para um filósofo. Após haver concluído os estudos em Cambridge, onde se dedicara especialmente à matemática, ensinou durante trinta anos geometria e mecânica. Em 1911, aos cinquenta anos de idade, foi nomeado leitor destas especialidades no University College de Londres; de 1914 a 1924 ensinou matemática aplicada no Imperial College da mesma cidade. Só em 1924, quando contava já sessenta e três anos de idade, foi nomeado professor de filosofia em Harvard, onde ensinou até 1937.

Podemos assinalar três períodos bem vincados, no que se refere a suas publicações científicas. A partir de 1898, foi publicando trabalhos de lógica matemática, coroados, de 1910 a 1913, pela obra monumental escrita em colaboração com Russell: Principia Mathematica. A seguir, ocupou-se principalmente de física e publicou vários estudos importantes sobre a filosofia da física. Em 1926, apresentou-se enfim como metafísico com a obra Science and the Modern World; três anos mais tarde, em 1929, sua obra principal, Process and Reality oferece um sistema completo.

Whitehead é um espírito de extraordinária amplitude. Matemático distinto, um dos fundadores da moderna lógica matemática, criou ao mesmo tempo uma filosofia do organismo. Embora especializado nas ciências da natureza, mostra, contudo, vivo interesse pela história e possui vastos conhecimentos históricos. Seu sistema baseado na física contém toda uma série de ideias biológicas e desemboca numa filosofia da religião. O estilo deste grande lógico relembra por vezes a linguagem dos místicos. À universalidade de seu saber, Whitehead alia a universalidade de uma inteligência aberta às mais diversas tendências espirituais e artísticas. Positivo no modo de expor os problemas, trabalhador emérito, analítico nos pormenores e dotado extraordinariamente para as visões sintéticas, representa com sua obra o arquétipo do filósofo no sentido mais nobre do termo.

Não é fácil classificar Whitehead na história do espírito. Pertence, como Russell, ao grupo dos neo-realistas ingleses, com os quais compartilha o método analítico, o realismo e a alta estima da ciência. Sua obra representa a elaboração filosófica mais completa, até ao presente, dos resultados das ciências da natureza. Ao mesmo tempo, é um platônico, file próprio nos diz que o é no sentido pleno da palavra e acrescenta que, em última instância, toda a filosofia europeia não é mais do que uma série de notas ao pé das páginas de Platão. Mas o seu platonismo é muito particular. Segundo ele, as ideias não possuem nenhuma atualidade, visto que são meras possibilidades. Encontram-se igualmente nele numerosos vestígios de aristotelismo, que se manifesta, sobretudo, em seu franco intelectualismo, unido a um amplo empirismo. Em certos aspectos (por exemplo, em sua teoria da apreensão — prehension), Whitehead aproxima-se de Leibniz, em outros, (substância) de Spinoza, ao passo que sua estética, não obstante proclamar uma ascendência kantiana, marcha claramente pela via aristotélica. Whitehead defende, como Bergson, o dinamismo e o evolucionismo, e assume, como ele, posição crítica perante o cientismo, mas chega até Deus por uma via puramente racional.

Contudo, seria inexato ver em Whitehead um eclético. Seu sistema distingue-se antes de mais nada pela unidade. Em toda parte e de maneira consequente, e não obstante com as modificações correspondentes, aplica ele suas ideias básicas originais de criação e de apreensão (prehension). Whitehead aparece assim, por um lado, como filósofo moderno, um dos pensadores mais modernos e eminentes de nosso tempo, intimamente familiarizado com a física, a matemática, a biologia e a filosofia do século XX, mas ao mesmo tempo mantém a especulação filosófica no plano intemporal em que Platão colocara esses problemas.

Nas páginas que seguem oferecemos tão-somente uma exposição muito sumária do sistema de Whitehead, baseando-nos, sobretudo, em Science and the Modern World; não podemos, infelizmente, ocupar-nos de sua obra capital, extremamente difícil.

BOCHENSKI, J. M. A filosofia contemporânea ocidental. Tradução: A.P. de Carvalho. [s.l.] Editora Pedagógica e Universitária Ltda., 1975.
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Alfred North Whitehead, Józef Maria Bocheński