de Castro – O dar-se e propor-se da informática, à luz das causas aristotélicas

No caso da informática, apesar do predomínio da concepção instrumental, é necessário encontrar uma relação livre com esta técnica, que nos permita ver através deste véu discursivo ordinário as formas essenciais que se insinuam e conformam sua aparência de técnica da informação. Enquanto meio, a informática é algo pelo qual alguma coisa é operada e assim obtida. O efeito, o resultado obtido com sua aplicação, por outro lado, indica que ela mesma pode ser considerada como causa, embora não única. Segundo Heidegger, o fim, segundo o qual a natureza dos meios é determinada, é também visto como causa. Por conseguinte, onde fins são perseguidos e meios utilizados, onde instrumentalidade reina soberana, lá domina a causalidade.

Em se tratando de causas, nada melhor do que se resgatar a teoria aristotélica das quatro causas, como nos convida Heidegger, para daí se iniciar uma nova problematização da técnica. Entretanto, desta feita não apenas seguindo o curso ordinário de entendimento dessa teoria, mas se indagando de partida sobre o sentido do termo “causa”, o porque da determinação de “quatro” causas, e a univocidade do caráter causal das mesmas, determinando sua solidariedade. Para Heidegger, sem estes questionamentos mais profundos da teoria das causas não podemos avançar no entendimento da causalidade, da instrumentalidade e da técnica.

O entendimento ordinário da noção de causa é de algo que “opera”, no sentido de “obter resultados”, “alcançar efeitos”. Segundo Aristóteles, quatro causas “operam” na constituição, por exemplo, de um cálice de prata: a causa materialis, o material empregado, a prata; a causa formalis, a forma dada a matéria, um cálice; a causa finalis, a finalidade que determinou esta conjunção de forma e de matéria, na constituição de um cálice sacrificial; e, a causa efficiens, aquela que produziu o efeito final, arregimentando as demais causas, por exemplo, o artesão.

Deste modo, a causa efficiens, assume a primazia da causalidade, a ponto mesmo de encobrir a causa finalis. Este sentido predominante de operar, efetuar, da noção causa, não tem, no entanto, nada a ver com o que os gregos denominavam causa: aquilo que responde por outra coisa. As quatro causas aristotélicas seriam os modos, solidários entre si, do “ato do qual se responde”, segundo Heidegger.

Tomando o exemplo clássico das quatro causas, na constituição de um cálice de prata, Heidegger dirige nosso pensar por novos caminhos, onde a noção de “causa” assume sentidos mais expressivos na interpretação da instrumentalidade e da técnica. A causa materialis e a causa formalis se apresentam como co-responsáveis imediatas pela re-velação material e tangível do cálice de prata. Porém cabe a causa finalis a responsabilidade pela definição do sentido do cálice, de sua razão de ser, antes e depois de sua constituição.

Quanto a causa efficiens, uma causa com esta qualificação era desconhecida por Aristóteles, que preferia em sua teoria das quatro causas, indicar para esta causa a responsabilidade pela presença e disponibilidade do cálice constituído, para aquela finalidade. O artesão considera e reúne a seu modo, as três causas mencionadas no “ato do qual se responde”. O artesão é a causa efficiens, enquanto co-responsável pela re-velação do cálice, pela emergência no não-oculto de um cálice composto de certa matéria e forma, segundo uma determinada finalidade.

Referências:

HEIDEGGER, M. Ensaios e Conferências. Tradução: Emmanuel Carneiro Leão; Tradução: Gilvan Fogel; Tradução: Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 2002.

Tese de Doutorado em Geografia (UFRJ, 1999)

DE CASTRO, M. C. SIG – Sistema de Informação Geográfico ou sig – sintetizador de ilusões geográficas. Desconstruindo uma formação discursiva. UFRJ-PPGG, , 1999. Disponível em: <https://www.academia.edu/43466069/SIG_Sistema_de_Informa%C3%A7%C3%A3o_Geogr%C3%A1fico_ou_sig_sintetizador_de_ilus%C3%B5es_geogr%C3%A1ficas_Desconstruindo_uma_forma%C3%A7%C3%A3o_discursiva_Murilo_Cardoso_de_Castro>