de Castro – Memória informacional-comunicacional

Que distância guarda a Memória da memória informacional-comunicacional tratada nesta investigação, embora a mesma denominação pareça indicar uma proximidade, algo em comum que na Memória se re-vela e na memória se vela de todo. Pois, nesta última, o que se tem é a mimese da Memória, capturada naquilo que tem mais próximo de um registro de símbolos, palavras ou imagens, que representam um ato ou um fato. Uma mimese onde prevalece de pronto a interpretação da Memória como apenas um depósito de símbolos armazenados na mente, referentes a atos ou a fatos, e passíveis de serem codificados em dados simbólicos, a serem armazenados em um suplemento artificial de memória, componente da tecnologia da informação.

Esta interpretação da Memória como simples depósito de palavras ou imagens, por sua vez, se aproxima em certo sentido, da memória informacional, guardando, no entanto, certa distancia de todos os esforços realizados desde a Antiguidade por estabelecer uma “arte da memória”. Pelo contrário, aproxima-se muito da evolução desta arte da memória e de suas técnicas aperfeiçoadas através da Idade Média e da Renascença, como muito bem indica Frances Yates (1966) em seu clássico, “The Art of Memory”.

Aquilo que se busca pela arte da memória e aquilo que se constrói pela memória informacional-comunicacional é, no primeiro caso, um artifício de Memória, enquanto no segundo, uma memória artificial. A diferença significativa é que na arte da memória, ainda se guardam os princípios enunciados por Heidegger de uma Memória, essência do homem, e se elaboram técnicas para o pensar, com base em linguagem, imagem, tropos, figuras e esquemas, que não visam a mimese, mas as condições de possibilidade do pensar, do meditar. Enquanto na memória artificial, só interessa a codificação, o registro, o armazenamento, a ordenação, a classificação, a busca e a recuperação como instrumentos de dis-ponibilidade da memória para sua exploração.

Por memória artificial, na teoria da informação moderna, entende-se a forma de sua codificação para armazenamento e recuperação, assim como o suporte material, a mídia, onde podem-se inscrever os dados simbólicos como sequências de 0 e 1, de acordo com o código binário. Esta memória, seja como disco rígido, disquete, CD-ROM, etc., é o suplemento de memória dis-posto pela tecnologia da informação, para armazenamento daquilo que é representável de atos e fatos na Memória. Guarda assim uma analogia com aquilo que a escrita representou no passado remoto enquanto um suplemento1).

Referências:

Tese de Doutorado em Filosofia (UFRJ, 2005)

DE CASTRO, M. C. O que é informática e sua essência. Pensando a “questão da informática” com M. Heidegger. UFRJ-IFCS, , 2005. Disponível em: <https://www.academia.edu/43690212/O_que_%C3%A9_inform%C3%A1tica_e_sua_ess%C3%AAncia_Pensando_a_quest%C3%A3o_da_inform%C3%A1tica_com_M_Heidegger>

  1. Neste sentido de suplemento já era questionada nos diálogos de Platão: “E o rei replicou: “Incomparável mestre em artes, oh Theuth (O tekhnikótatú Theúth), uma coisa é o homem capaz de trazer à luz a fundação de uma arte, outra aquele que é capaz de apreciar o que esta arte comporta de prejuízo ou utilidade para os homens que deverão fazer uso dela. Neste momento, eis que em tua qualidade de pai dos caracteres da escrita (patér òn grammáton), atribuíste-lhes, por complacência para com eles, todo o contrário (tounatíon) de seus verdadeiros efeitos! Pois este conhecimento terá, como resultado, naqueles que o terão adquirido, tornar suas almas esquecidas uma vez que cessarão de exercer sua memória […] Não é, pois, para a memória, mas para a rememoração que tu descobriste um remédio (oúkoun mnémes, allà hupomnéseos, phármakon heûres)”. (Fedro, 274 e 275b, apud Derrida, 1972, p. 126-127