de Castro – Sintetizador de Representações

As sucessivas gerações de computadores, dada sua natureza comum de dis-positivo de representação, tornam assim dis-poníveis novos sintetizadores de ilusões informacionais e comunicacionais, cada vez mais funcionais e eficientes. Sintetizadores dis-postos como estruturas de dados simbólicos que representam a memória humana, tratadas por algoritmos, que representam a razão humana, operando sobre uma base material de circuitos lógicos, formando um “sistema informacional-comunicacional”, com a pretensão de construir e explorar uma representação do mundo, ou de apenas uma parte ou um simples aspecto deste. Isto, é claro, na vigência da informatização que promove uma espécie de desconstrução e reconstrução, deste mesmo mundo, ou parte, ou aspecto do mesmo, sob o modo digital de um modelo dito informacional-comunicacional.

A ilusão (do latim illudere, jogar com) define-se justamente como um erro de tipo particular, devido não à falta de atenção ou de método, mas devido às aparências que abusam de nós mesmos, nos fazendo ver a realidade diferentemente do que ela é. E é assim que sob a aparência de um simples instrumento informacional-comunicacional, a tecnologia da informação joga com um modelo da realidade construído sobre a abstração de dados simbólicos memorizados em meio digital, operados por algoritmos sob a forma de programas de computador, em uma construção artificial que pleiteia apreender qualquer ente pela representação de sua suposta entidade informacional-comunicacional.

A tecnologia da informação enquanto dis-positivo de representação, ou enquanto engenho de representação, emerge nos dias de hoje segundo a metafísica da Modernidade. Este engenho opera1) em plena conformidade com o meio técnico-científico-informacional a partir do qual é constituinte e constituído.

Qual a essência do ser sem abrigo, se ele consiste na objetivação que, ela mesma, reside na auto-imposição deliberada? O lado objetivo do mundo se torna con-stante (ständig) na produção representante. Esta representação presenta. Mas este presente é presente em uma representação que tem o caráter do cálculo. Esta representação não conhece nada de figurativo. Faz falta a intuição possível do aspecto das coisas, a imagem que elas oferecem ao conhecimento sensível imediato. A produção calculante da técnica é um “fazer sem imagem” (Nona Elegia). Diante da imagem visível das coisas, a auto-imposição deliberada e seus projetos colocam a proposição do esquema, que nada mais é que uma ficção calculada. Quando o mundo se funda na objetividade de ficções calculadas, ele é instituído no insensível e no invisível. A constância da objetividade deve sua presença a uma intimação cuja atividade pertence à res cogitans, quer dizer à consciência. A esfera de objetividade dos objetos resta no interior da consciência. O invisível do objetivo resulta da interioridade da imanência da consciência. (Heidegger, 1949/1962, pág. 366, negrito meu)

Referências:

HEIDEGGER, M. Ensaios e Conferências. Tradução: Emmanuel Carneiro Leão; Tradução: Gilvan Fogel; Tradução: Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 2002.

Tese de Doutorado em Geografia (UFRJ, 1999)

DE CASTRO, M. C. SIG – Sistema de Informação Geográfico ou sig – sintetizador de ilusões geográficas. Desconstruindo uma formação discursiva. UFRJ-PPGG, , 1999. Disponível em: <https://www.academia.edu/43466069/SIG_Sistema_de_Informa%C3%A7%C3%A3o_Geogr%C3%A1fico_ou_sig_sintetizador_de_ilus%C3%B5es_geogr%C3%A1ficas_Desconstruindo_uma_forma%C3%A7%C3%A3o_discursiva_Murilo_Cardoso_de_Castro>

  1. Entendido assim como trazer e levar à vigência, o verbo “operar”, “wirken”, invoca um modo de o real se realizar, de o vigente viger e estar em vigor. Operar é, pois, trazer e levar à vigência, seja que, por si mesmo, algo traga e leve a si mesmo para a sua própria vigência, seja que o homem exerça este trazer e levar. (Heidegger, 1954/2002, pág. 42