de Castro – Manualidade e manualidade informacional

O ser do Dasein “ex-siste” no mundo. Pois o ser está em exílio, fora de si mesmo, sem abrigo, pro-jetado. Busca habitar e acaba por criar um mundo no qual se re-encontra no Dasein e na manualidade (Zuhandenheit). Evidenciando que “a doação dos desempenhos e das possibilidades de desempenho proporciona os seres à mão, os seres constituídos pela manualidade: os instrumentos, os utensílios, os equipamentos, os dispositivos etc.”1.

Essa manualidade composta por instrumentos, utensílios, ferramentas, que os gregos denominavam pragmata é que põe em evidência o aspecto prático, da apreensão das coisas na ocupação. A primeira abertura do Dasein ao mundo se dá por esta ocupação constitutiva de um mundo da manualidade, onde a “cura” (Sorge) exerce uma “função de apresentação” fundamental2.

Obedecendo a característica manual de qualquer instrumento, é a mão que ativa e mantém operacional a informática diante do homem, o que indica uma espécie de “manualidade informacional”: uma relação especial entre Dasein e instrumentos do engenho de representação, que é dada pelo método informacional-comunicacional. Qualquer tecnologia da informação conta com o Dasein que o “anima” e manipula; mesmo que o faça segundo o método de aplicação e os requisitos de operação e de uso, imanentes ao meio de onde a tecnologia emerge à mão.

O ser do instrumento na ocupação se dá como um “servir para”, onde o para não indica apenas funcionalidade, mas remetimento de um instrumento a outro. Esta interdependência dos instrumentos entre eles mostra que um instrumento único é uma incongruência ontológica. O ser do instrumento se caracteriza na dupla referência ao Dasein, do qual depende ontologicamente, e aos outros instrumentos que formam seu “mundo circundante”, seu meio. Do mesmo modo que aquilo que é tecnologia da informação se caracteriza na dupla referência ao homem que a manipula e ao meio técnico-científico-informacional, de onde emerge.

Eis a razão pela qual se torna tão difícil uma contemplação sobre a essência da informática. Sua funcionalidade, indicada pelo “servir para” da tecnologia da informação na ocupação, indica sua utilização como mais natural ao Dasein, que a meditação sobre sua essência. A partir do momento que o ser dos instrumentos informacionais-comunicacionais, enquanto entes disponíveis para uma utilização possível, consiste na manualidade, fica claro que sua natureza é re-velada apenas pela “circunvisão” (Umsicht).


  1. Notas em HEIDEGGER, Martin. Ser e Tempo I. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 1986/1998 

  2. HEIDEGGER, Martin. History of the Concept of Time. Trad. Theodore Kisiel. Bloomington: Indiana University Press, 1979/1985