de Castro – O “mundo” do atelier

Heidegger tinha uma preocupação com a natureza do trabalho e da produção. Não se surpreende seu foco no meio dos anos 1920 com a natureza da artesania. Além de demonstar sua insatisfação com os modos industriais de produção, a análise de Heidegger do instrumental e do atelier do artesão visava (v. Ser e Tempo §16): (1) prover um ponto de partida para compreensão da existência humana como ser-no-mundo; (2) revelar a primazia da compreensão instrumental do ser dos entes em oposição à compreensão objetiva-científica; estabelecer a base necessária para revelar que o “significado” (Sinn) unificador do ser dos entes está assentado na temporalidade.

Ele prefaciou sua análise do atelier com as seguintes considerações. Para compreender o ser como tal, e sua relação com o templo, Heidegger argumenta, devemos escolher um ente particular a fim de investigar seu modo de ser. Devemos sabiamente escolher, de maneira que nossa análise do modo de ser do ente escolhido proporcione visão aplicável aos modos de ser de outros entes também. Dado que o ente humano, Dasein, é o ente caracterizado por sua compreensão de seu próprio ser e aquele de outros entes, Heidegger conclui, o ente humano seria uma excelente escolha para ser tema da investigação ontológica inicial.

Heidegger usou sua versão do método fenomenológico para sua “analítica existencial” do Dasein humano. Definiu a fenomenologia como ontologia: esta espécie de interpretação que permite a uma entidade mostrar-se na forma apropriada para este ente ele mesmo. Toda interpretação implica em uma pré-concepção, um pré-dispôr e uma pré-visão. Esta pré-estrutura está em operação não somente na interpretação teorética mas na interpretação implicada em meu uso de uma ferramenta. Como é que posso tão prontamente usar ferramentas?

Aderindo à chamada fenomenológica de retorno “às coisas elas mesmas” (zu den Sachen selbst), escolheu fundamentar suas análises em uma descrição do que as pessoas realmente faziam em sua vida diária.

Consideremos o artesão em seu atelier. Ele usa ferramentas para fazer seu artesanato. Como isto é possível? Porque compreende de antemão o equipamento e suprimentos com o qual trabalha em termos da rede de relacionamentos e possibilidades que constituem o mundo.