de Castro – Informação enquanto enunciado

Heidegger indica caminhos por onde pensar a informação, enquanto enunciado, em seu questionamento sobre “o que é uma coisa?”:

Característica, extensão, comparação, lugar, tempo, são determinações que, em geral, são ditas da coisa. Estas determinações indicam em que perspectiva as coisas se nos mostram, quando, no enunciado, nos dirigimos a elas e falamos delas, indicam os caminhos-do-olhar nos quais olhamos as coisas e a partir dos quais elas se nos mostram. Mas, na medida em que essas determinações são sempre colocadas sobre a coisa, a coisa é, de um modo geral e sempre, dita com elas, como aquilo que já está presente. Aquilo que, em geral, é dito sobre cada coisa, a este «dito em direcção à coisa» e no qual a universalidade e a coisalidade da coisa se determinam, os Gregos chamam kategoria (kata-agorenein). Mas o que é dito deste modo não visa senão o ser-de-um-certo-modo, o ser-extenso, o estar-em-relação, o estar-ali, o estar-agora, que é próprio das coisas enquanto entes. Não podemos trazer para diante do olhar, nem muitas vezes, nem com a penetração suficiente, este estado-de-coisas agora evidenciado, nomeadamente o facto de que as determinações que constituem o Ser do ente e, portanto, da própria coisa, retiram o seu nome do enunciado acerca da coisa. Este nome para as determinações-de-ser não é uma designação como qualquer outra, mas, nesta designação das determinações-de-ser como modos da enunciabilidade, reside uma interpretação particular do Ser. O facto de, desde há muito tempo, as determinações do Ser serem chamadas, no pensamento ocidental, «categorias» é a expressão mais nítida do que já acentuámos: o facto de a estrutura da coisa estar em relação com a estrutura do enunciado. O facto de outrora e ainda hoje a doutrina escolar acerca do Ser do ente, a «ontologia», colocar como objectivo próprio a fixação de uma «doutrina das categorias», exprime a interpretação originária do Ser do ente, quer dizer, da coisalidade da coisa, a partir do enunciado.1

O enunciado é um modo de discurso segundo uma perspectiva. No caso da informação, do enunciado, do “dito em direção à coisa”, pela tecnologia da informação em interação com o homem, trata-se de um discurso informacional-comunicacional. Onde estes qualificadores denotam um método que inicia pela desconstrução do visado, segundo uma perspectiva informacional-comunicacional, em seus atributos e nos algoritmos que tratam estes atributos segundo uma mimese do visado. A posterior codificação destes atributos em dados simbólicos, a captura destes dados simbólicos para a forma digital e seu armazenamento na tecnologia. Para então, consumindo o método, realizar a reconstrução do visado dis-posto para exploração em sua mimese digital.

O enunciado é um modo de legein — dirigir-se a qualquer coisa, enquanto qualquer coisa. Isto significa: acolher qualquer coisa como tal. Ter qualquer coisa como qualquer coisa e entrega-la como tal, diz-se, em latim, reor, ratio: daí ratio se ter tornado a tradução de logos. O simples enunciado dá, ao mesmo tempo, a forma fundamental em que visamos a coisa e pensamos algo acerca dela. A forma fundamental do pensamento e, em consequência, o pensar, é o fio condutor da determinação da coisalidade da coisa. As categorias determinam, em geral, o Ser dos entes. Perguntar pelo Ser dos entes, pelo que é e como é, em geral, o ente, é a primeira tarefa da filosofia; perguntar deste modo é filosofia do mais alto nível, é primeira e autêntica filosofia, proto philosophia, prima philosophia.

Eis o que é essencial: o pensamento como simples enunciar, o logos, a ratio, é o fio condutor para a determinação do Ser do ente, quer dizer, para a determinação da coisalidade da coisa. «Fio condutor» tem, aqui, o seguinte significado: os modos de enunciabilidade conduzem o olhar em direcção à determinação da presença, quer dizer, em direcção ao Ser dos entes.2


  1. HEIDEGGER, Martin. Que é uma coisa ?. Trad. Carlos Morujão. Lisboa: Edições 70, 1992, pág. 70 

  2. ibid., pág. 71